
O representante legal
dos credores da dívida soberana de Moçambique defendeu hoje à Lusa que a
decisão do Conselho Constitucional (CC) não se aplica à dívida atual, mas sim à
emissão obrigacionista feita pela empresa EMATUM.
"A decisão
incide sobre a garantia do Governo ao financiamento da EMATUM. Essa garantia
foi extinta em abril de 2016 e não envolve qualquer parte dos 'eurobond'
[títulos de dívida soberana emitidos em moeda estrangeira]", disse Thomas
Laryea.
Em declarações à
Lusa, o representante legal do grupo de detentores de mais de 60% da dívida de
726,5 milhões de dólares (cerca de 645,5 milhões de euros ao câmbio de hoje)
emitida em 2016, quando o Governo reconverteu as obrigações da Empresa
Moçambicana de Atum (EMATUM) em dívida soberana através de uma emissão no
mercado internacional, afirmou ainda que esta é uma nova obrigação.
"Os 'eurobond'
constituem uma obrigação legal nova do Governo moçambicano, que é um devedor
diferente da EMATUM, e com credores substancialmente diferentes", vincou.
Esta dívida "foi
publicamente aprovada pelo parlamento moçambicano, de acordo com a Constituição
de Moçambique e dentro dos limites da Lei do Orçamento", acrescentou.
Em reação à decisão
do Conselho Constitucional de Moçambique, que declarou nulo o empréstimo e as
garantias soberanas conferidas pelo Estado à EMATUM, Thomas Laryea argumentou
que a dívida soberana "foi emitida nos mercados públicos, sustentada em
documentação aprovada legalmente e de acordo com a lei britânica".
Por isso, concluiu:
"Dado que o tribunal de Moçambique não tem jurisdição sobre os 'eurobond',
esperamos que a reestruturação dos 'eurobond' prossiga como acordado".
A emissão de dívida
soberana de Moçambique, feita em 2016, resulta de um acordo com os credores dos
títulos obrigacionistas da EMATUM, no valor inicial de 850 milhões de dólares
(755 milhões de euros), que tinham sido lançados em 2013 pela empresa de pesca
de atum, com garantias estatais.
Em 2016, Moçambique
propôs aos credores a troca desses títulos obrigacionistas, cujo devedor era a
EMATUM, por uma emissão de dívida soberana no valor de 726,5 milhões de dólares
(646 milhões de euros), cujo primeiro pagamento era devido em janeiro de 2017,
mas que nunca foi pago, consumando a chamada “crise da dívida oculta”.
O Conselho
Constitucional de Moçambique declarou nulo o empréstimo e as garantias
soberanas conferidas pelo Estado no valor de 726,5 milhões de dólares (646,7
milhões de euros) à empresa estatal EMATUM.
Num acórdão hoje
divulgado, no seguimento do processo aberto pelo Fórum de Monitoria do
Orçamento, plataforma das organizações da sociedade civil com dois mil
subscritores, os juízes declaram "a nulidade dos atos inerentes ao
empréstimo contraído pela EMATUM e a respetiva garantia soberana conferida pelo
Governo, em 2013, com todas as consequências legais".
Os requerentes
solicitaram em julho de 2017 a declaração de inconstitucionalidade do
empréstimo da EMATUM, empresa pública que beneficiou das dívidas ocultas do
Estado moçambicano, um dossiê alvo de investigações judiciais nos Estados
Unidos da América e Moçambique por corrupção.
A decisão surge
quatro dias depois de o Governo anunciar uma renegociação para começar a pagar
aos credores.
Fonte do Ministério
da Economia e Finanças moçambicano disse à Lusa que qualquer reação será
remetida para depois da leitura do acórdão.
A EMATUM contraiu em
2013 um empréstimo de 850 milhões de dólares através da emissão de títulos
('eurobonds') junto do banco Credit Suisse para importação de embarcações,
equipamentos de pesca e para proteção costeira, sem que tivesse autorização no
Orçamento de Estado (OE).
O OE de 2013 é omisso
quanto ao assunto, assim como a Conta Geral do Estado (CGE) de 2013, surgindo
os avales na CGE de 2014, por isso, alvo da contestação entregue no CC.
A própria Assembleia
da República, chamada a responder às questões colocadas pelos requerentes,
assumiu perante o CC tratar-se de garantias "prestadas de forma ilegítima,
cuja consequência é a sua nulidade", desde que declarada pelas entidades
competentes, sem especificar, lê-se no acórdão.
No entanto, considera
também que "o Estado não pode recusar-se ou furtar-se de cumprir
obrigações internacionais, sob alegação de o Governo ter violado disposições de
direito interno".
Por essa razão, a
Assembleia da República entendeu melhor "aprovar a CGE que inclui os mapas
demonstrativos dos pagamentos feitos pelo Estado relativamente às dívidas da
EMATUM, visando facilitar o controlo desta atividade financeira do
Estado".
Mas os juízes do CC
discordam e chegam a citar a própria Assembleia da República ao admitir a
"nulidade" dos atos.
"Como é
evidente, indiscutivelmente, o Governo atuou à margem da Constituição",
que reserva ao parlamento a autorização de operações de crédito ou emissão de
avales.
O CC refere ainda que
o executivo atuou com "usurpação do poder" e praticou atos nulos ao
ignorar as leis.
O presidente do
Conselho Constitucional, Hermenegildo Gamito, agendou uma comunicação à
imprensa para quarta-feira, às 11:30 locais (mais uma hora em Lisboa), em que
se deverá pronunciar sobre o acórdão.
Lusa
Moçambique anulou a divida mas aqueles
donos dizem que a dívida soberana foi emitida nos mercados públicos, com
documentação legal e de acordo com a lei britânica, "tribunal de
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